sexta-feira, 10 de agosto de 2012

O Brasil é ouro em críticas erradas

Em época de olímpiadas é sempre a mesma coisa. O país é tomado por sentimentos antagônicos. Em parte, a população se torna extremamente nacionalista torcendo por cada atleta, cada modalidade, cada brasileiro que "representa uma nação". Em outra parte, todos se tornam técnicos e críticos vorazes desses atletas alegando que eles deveriam se esforçar mais, correr mais, pular mais, se matar se preciso já que estão em uma competição representando o Brasil. Ao meu entender, como em muitas outras situações, as críticas são bem vindas desde que feitas racionalmente e, principalmente, dirigidas para o alvo correto. Neste post colocarei rapidamente algumas idéias que me deixam perplexos ao ouvir tais críticas.
Para começar, já deixo claro que nem entrarei na questão dos animais que ficam escondidos atrás de redes sociais xingando de forma preconceituosa alguns atletas como a judoca Rafaela Silva. Esses infelizes se acham críticos do esporte brasileiro mas são verdadeiros cretinos virtuais.

Mas vamos ao que interessa: as críticas...

"Se não ganhou o ouro, deveria devolver o meu dinheiro"

Primeiramente, este é um pensamento ridículo por natureza. Investimento público em esporte não tem foco em resultado! Tem foco no desenvolvimento da sociedade, no esporte nas escolas públicas, nos centros de esporte em todo o país que tiram crianças das ruas, no pagamento do salário do técnico de esgrima que pode formar atletas que nunca chegarão a campeonatos algum, etc...

Resumir o resultado de um investimento público em esporte a número de medalhas em Olimpíadas é pedir para que políticos não pensem no longo prazo. É a pressão pública idiota, que força os governantes a deixarem de investir em esporte, simplesmente, por que o "povo" vai se revoltar se este resultado não vier nos próximos 4 anos... e em 4 anos não se forma NENHUM atleta de elite no mundo!

Além do mais de toda a verba pública do último ciclo olímpico (cerca de R$ 2 bilhões) pouco mais da metade não veio de verbas diretas do Ministério do Esporte (o "seu dinheiro"), mas sim, de outras fontes como a lei Piva (repasse de loterias de federais) que contribuiu com mais de R$ 550 milhões e patrocínio de estatais que contribuiram com outros R$ 520 milhões.

Cobre errado e faça os governantes agirem errado

Continuando com a crítica do tópico acima, um resultante comum é: como pode investir R$ 2 bilhões em um ciclo olímpico e não ganhar nada! Simples, meu caro crítico especialista master, não se formam atletas em 4 anos. Nem em 8!

Os atletas que competiram agora em Londres, em sua maioria, nasceram na década de 80 e foram formados na década de 90. Quando se olha esporte, se olha a formação da pessoa! A estrutura disponível quando ela nasceu e cresceu! Os atletas que estão em Londres, se formaram com qual estrutura? Qual era a verba para os esportes que eles praticam? Quanto eles tiveram que colocar dinheiro do próprio bolso para chegarem onde chegaram? Portanto, se você quer criticar a verba do ciclo olímpico de Londres, você deveria avaliar resultados de atletas de 6 a 10 anos. Pelo que eu me lembre não vi ninguém desta idade em Londres!

Novamente, ressalto que esta pressão pública por resultados pode levar a ação de curto prazo. Qual seja colocar pouco dinheiro em poucos atletas que tem chance de medalha. E aí você ficaria feliz com o ouro do futebol, outro do judô e outro da natação... e a estrutura esportiva brasileira... azar!

Por que sempre os EUA ganham tudo?

Por que será que os EUA sempre estão na ponta de cima da tabela? Eles são mais talentosos? Eles são menos emotivos? Não, caro "crítico expert plus", eles tem uma estrutura de formação de atleta invejável.

Você não precisa nem ir até os EUA para ver esta estrutura. É só assistir na ESPN os campeonatos universitários de qualquer esporte: basquete, atletismo, futebol americano, etc. As universidades americanas tem estádios que são muito mais modernos e maiores do que estádios de tradicionais clubes brasileiros - como o estádio da Universidade de Michigan com capacidade para 109,000 torcedores (detalhe que a cidade local de Ann Arbor tem 114,000 habitantes, ou seja, o estádio cabe quase que a população inteira).

E não é só isso! Praticar esporte nas universidades americanas é tão importante quanto estudar! O peso é o mesmo e, em alguns casos, é maior! Enquanto que no Brasil você precisa praticamente abdicar do estudo se quiser seguir com um treinamento de elite, nos EUA as coisas andam paralelamente.

Você acha que a nossa estrutura é grande? Então me diga rapidamente se você conhece pessoalmente um local para praticar: tiro esportivo, ginástica artística, nado sincronizado, arremesso de dardo.....

Fetiche do "ouro"

Brasileiro tem um fetiche com o ouro da medalha principal. Se não é ouro, não é nada! Despreparado, mal treinado, AMARELÃO! Isso é olhar a ponta do iceberg e achar que conhece o tamanho dele inteiro!

A medalha de ouro não tem que ser alvo de críticas! Tem que ser consequência! Críticas positivas são aquelas que possam resultar em algo melhor. São feitas racionalmente, com base em fatos, dados concretos e não com base em emoção de torcedor. Críticas mal feitas, normalmente, resultam em ações equivocadas.


Também não sou especialista na área, mas tenho uma humilde opinião de que o atleta nunca deveria ser alvo de críticas. Por que ele é resultado e não causa! As verdadeiras perguntas que deveríamos estar fazendo é:

- Por que o presidente do COB (Comitê Olímpico Brasileiro) está no cargo há 17 anos - e ficará por, no mínimo, mais 3?

- Quantos atletas vieram de escolas públicas?

- Quais são as opções para uma criança brasileira que quer praticar esporte?

- Você trocaria sua carreira para se tornar atleta profissional (financeiramente falando)?

Quero saber a sua opinião!

-- Em tempo, o Brasil neste momento está na 26 posição no quadro de medalhas. Irã está em 14 e Coréia do Norte em 16. Reveja seus conceitos! De tudo!

12 comentários:

  1. Perfeito...
    Estudei nos EUA na high school e conheço bem a estrutura deles. Eu morava numa cidade com 3.000 habitantes e a minha escola (a única da cidade) tinha um ginásio com capacidade para 1.000 pessoas que lotava em todos os jogos de basquete! Era cobrada uma entrada e toda a renda de guloseimas que eram vendidas durante o jogo ia para a escola! Quem trabalhava vendendo ingresso e hot dog eram pais de alunos e de forma voluntária! Para ajudar a comunidade! É uma questão cultural! Dei apenas esse exemplo, mas a escola tinha estrutura cometa de atletismo, futebol, vôlei e etc...
    Sempre me questiono, será que o Phelps teria todas essas medalhas se tivesse nascido no Brasil?
    O investimento de massa em esportes no Brasil é ridículo! Brasileiro que ganha medalha no Brasil deveria levantar a bandeira da sua família, patrocinador, pai, mãe... Raramente foi investimento brasileiro.
    Me estendi um pouco... Mas concordo muito com tudo isso.

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    1. "Brasileiro que ganha medalha no Brasil deveria levantar a bandeira da sua família", perfeita essa frase!!

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    2. Daniel,
      Obrigado pelo seu comentário! Realmente a frase que a Carol destacou acima é muito boa! Poderia ser o título deste post!

      Abs,
      Marcelo

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  2. Rebatendo só pra provocar! hahahaha!

    "Se não ganhou o ouro, deveria devolver o meu dinheiro"
    Vamos combinar que investimento público em esporte não é SÓ patrocínio de atleta, E que patrocínio de atleta visa resultados, SIM. Até como forma de estimular novos praticantes etc etc etc. Ressalva: bom resultado não necessariamente significa medalha!

    Por que sempre os EUA ganham tudo?
    Concordo, mas.. nova ressalva: soma-se a cultura esportiva um preparo psicológico e uma forma de lidar om a vitória, com a competição, a concorrência... que também entra na equação. E, quem abe, é resultado desse próprio investimento no esporte universitário/ colegial. Concordamos nessa (em parte).

    Fetiche do "ouro"
    Eu acho que há ouros, e há OUROS. O mesmo vale para as medalhas de bronze e para os 16as colocações. Uns são gratas surpresas provenientes de superação e garra. Outros são decepções advindas de amareladas, falta de preparo, profissionalismo e estrutura psicológica (cultural?).

    Qnto aos questionamentos finais: divido-os com você.

    E o exemplo de Coreia do Norte e Irão são execelentes, na minha opinião. Só não sei se pelos mesmos motivos que para você! Heheheheh!

    Abs

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    1. Uma potencia esportiva só se faz quando se une Esporte com Educação. Deveríamos abrir as instalações das forças armadas para que crianças de escolas públicas tivessem onde praticar esportes. No Rio de Janeiro existem 3 vilas olimpicas, mas temos mais de dez pistas de atletismo escondidas dentro de quartéis militares. Porque não usá-las?

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    2. Boa colocação Carlos! Em São Paulo também temos algumas instalações militares que poderiam ser melhor utilizadas.

      Abs,
      Marcelo

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    3. Fran,

      Seus comentários são pertinentes. Eu concordo com tudo o que você diz. Só acho que o foco não é o atleta, mas sim a estrutura.

      Quanto a CN e Irã, acredite, o motivo é o mesmo! :)

      Abs,
      Marcelo

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  3. Sem muito o que escrever, afinal você já disse tudo!!!
    Concordo plenamente com suas palavras!! Alguém falou... Parabéns !!!

    beijãozão*

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  4. Bom, existe uma questão simples que ninguém aborda: Alunos aprendendo qualquer modalidade esportiva em qualquer local demanda profissionais para ensinar, se for voltado para qualquer atividade esportiva específica (tiro com arco, ginastica olímpica, esgrima, esportes de lutas, entre outros) teriam de existir cursos de extensão, os quais o MEC não reconhece por falta de LITERATURA. Títulos traduzidos não são aceitos por questões inerentes ao MEC em parte, parcialmente sem razão para os temas que não envolvam a miscigenação e biotipo brasileiro, sem querer me aprofundar muito, apenas explanando.
    Ora, se o técnico é formado no exterior, onde estes cursos existem, o Brasil não reconhece. Então simplesmente, se tivermos mil crianças (e temos) querendo aprender uma modalidade esportiva por afinidade ou por possuir um biotipo e perfil perfeito, o mercado não tem profissionais. Não falamos de alto rendimento sem antes, falarmos de base, como vc bem lembrou nos moldes americanos que são "College". Se eles não tem profissionais, importam o que tem no mercado, atuam de forma esportivamente efervescente e começam a capacitar os deles. Então o problema esportivo do Brasil é de incompetência generalizada governamental, por ter seu quadro profissional formado por funcionários que não entendem nada de esporte. Se entendessem, todo o investimento financeiro brasileiro seria melhor aproveitado.
    O esporte no Brasil sempre foi voltado para a elite e militares. Somente a elite pode ser sócia de um clube para poder praticar 90% das modalidades, bem como, os militares e seus familiares praticarem esportes nos Clubes Militares, com técnicos de origem militar, ativos ou não, sem cursos reconhecidos pelo MEC ministrados na EsEFEx, o maior centro de fisiologia do esporte, ministrarem as modalidades esportivas.
    Tudo beira o absurdo, onde medalhista no Brasil é herói.

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    1. Uma pena que você não se identificou pois os comentários são perfeitos!

      O blog é uma forma de discutir... Agora, precisamos achar maneiras de mudar a situação!

      Abs,
      Marcelo

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  5. A frase do Daniel Paciornik realmente é perfeita. E o velho ditado volta a tona: Brasileiro é guerreiro!
    Nestas olimpíadas de Londres o Brasil obteve a sua melhor performance em toda a história. Houve evolução em esportes que muitas vezes passaram batidos.

    Me pergunto também por que o Brasil conquistou mais medalhas do que países de primeiro mundo como Suécia, Noruega, Dinamarca, Finlândia, Canadá, entre outros. Cultura? Bom, no Brasil todos sabemos que temos uma forte cultura esportiva. Não conheço sobre as estruturas voltada para o esporte destes países mas a princípio sabemos da tamanha referência que os mesmos são em qualidade de vida, justiça política e educação.

    Também acredito que o foco de um atleta são resultados sim, mas isso não significa necessariamente que o foco deve ser em medalhas, ou primeiros, segundos e terceiros lugares. Muitas vezes trata-se de uma superação pessoal ou de objetivos particulares.

    Atletas mais populares também servem de modelo para inspirar novos atletas. O ser humano necessita de motivação e/ou uma referência.

    Belo texto!

    Abraço,

    Bruno.

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